terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Um beijo agora

É inexplicável
Esse desejo
Que me assombra;
Me atormenta.
O desejo louco por teu beijo.
Ao menos me vejo,
De novo,
Tomada pela poesia,
Ansiosa pela caneta.
Vontade de escrever
O que der na veneta!
Expor mesmo o que sinto...
O grande perigo,
uma vez que não minto,
E não oculto
A fantasia a que me permito.
Ah, coisa boa,
estar aqui, à toa,
A desejar tua boca,
A deixar correr solto
O pensamento,
o sentimento.
O instante captado:
aquele momento
que volta à memória
a toda hora.
Pena que fostes embora
Sem saber que te quero
E que pelo tempo afora
Vou seguir te querendo
como agora.
Agora.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Caravana Imaginária

Tão agradável me é sua companhia
Compartilhar os sonhos e projetos
Ouvir boa música
Estar em mim plena, em ti, contigo

Participar dos seus desejos
e tornar reais os meus
Ser eu mesma
Rir e sentir-me bem

O meu riso sincero
A sua voz encantada
A força de um olhar maduro
Um amor no escuro

Escondo e curto
Ilusão solitária
Caravana imaginária
de um desejo sincero e singelo...
Apagado.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Bienalizei-me.



Fui à Bienal de SP este final de semana. Desde os tempos da faculdade de museologia eu curto o evento, só tendo perdido a edição anterior - talvez a mais polêmica -, porque eu estava morando no Pará.
Adoro. Como sempre, adorei.
Farei nova visita, pois é sempre impossível ver tudo em um único dia. Com calma então...
Gosto da experiência de ir sozinha e acompanhada: fruir as obras só com meus próprios pensamentos e depois (ou antes, tanto faz) ouvir e compartilhar sensações sobre as obras com outros.
Conto aqui brevemente minhas opiniões sobre esta edição: como sempre, tudo muito. Muita coisa ruim, muita coisa boa, muitas coisas ótimas. Muito charlatanismo e muita criatividade. Quer encontrar contradição? Vá à Bienal. Deve ser isso que faz dela uma mostra tão boa. Muita coisa pra ver, muita gente, muitos, muitos, mas MUITOS mesmo, vídeos. Muita obra audiovisual. Muitos vídeos e instalações com projeções. A maioria me disse pouca coisa ou animou pouco. Vejamos se na próxima visita eu vejo algo nesta área com mais boa vontade.
Achei pífia a badalada participação dos pichadores, ditos incluídos nesta edição. Incluídos uma ova! Pixação em registro fotográfico, videográfico e em desenhos? (o que era aquele painel que parecia mural de escola pública com trabalhinhos infantis ou banheiro de boteco em grandes dimensões?) Ainda por cima, sempre nas paredes mais escondidas e perdidas do pavilhão. Nonsense pra mim. Era melhor manter os pixadores do lado de fora e assumir a não aceitação do que relegá-los àquilo.
Uma coisa que me chamou muita atenção positivamente foi que muito do que me interessava, se destacava pra mim, me encantando de alguma forma, era de alguém que nasceu ou vive e produz no nordeste. Gratas surpresas. Principalmente do Recife! Muito bacana.
E muita farra. Sempre muito bom experimentar e interagir com tantas obras.
Depois da próxima visita, postarei aqui mais comentários.
Béééé de ovelha ainda cansada de tanto andar.

sábado, 20 de novembro de 2010

Pérolas da Bruna


Esta semana Bruna estava especialmente inspirada para tiradas engraçadas.

A primeira foi ao acordar, outro dia; me olhou e sentenciou: "mãe, o seu cabelo tá todo bagunçado". Colaborando com a minha auto-estima!!! risos

Eu devia ter suposto naquele momento que ia ser uma semana animada...

Em outra ocasião, acordou cantando: "era uma casa engraçada, não tinha pareeeede". A rima é dela: novos arranjos para um clássico. hehehe Importante é que ela acordou inspirada. Quem canta, seus males espanta!

A escatológica foi ontem: "mamãe, meu bumbum espirrou". Genial!

Hoje me surpreendeu e preocupou. Acabo de vestir uma daquelas roupas horrorosas, com um super estampado, daquelas que a gente só usa em casa e olhe lá! Ela me olhou e, muito animada, comentou espontâneamente, com muita ênfase: "que lindo! Gostei dessa roupa mamãe!" Mini peruinha total. Eu devia receber como um elogio, mas fiquei mesmo foi preocupada com o gosto estético da menina. hahahaha :-)

Bruna é minha delícia, definitivamente.
Béééééé de mãe coruja! Inté.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Sempre Clarice!

"O que eu sinto eu não ajo,
O que eu ajo não penso,
O que eu penso não sinto,
Do que sei sou ignorante,
Do que sinto não ignoro,
Não me entendo
e ajo como se entendesse."

Clarice Lispector

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

José

"E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
"

Ouça o próprio poeta declamando seu poema em: http://www.memoriaviva.com.br/audio/jose.mp3

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Feliz dia do poeta!

Hoje é dia do poeta e por isso presto aqui minha homenagem com um texto inspirador de um poeta não muito famoso no Brasil, o argentino Juan Gelman (traduzido por Eric Nepomuceno).

"Poema XXXIII

basta
não quero mais morte
não quero mais dor ou sombras basta
meu coração é esplêndido como a palavra

meu coração tornou-se belo como o sol
que sai voa canta meu coração
de manhã cedo é um passarinho
e depois é teu nome

teu nome sobe todas as manhãs
aquece o mundo e se põe
só em meu coração
sol em meu coração"

Juan Gelman; do livro Amor que Serena, termina? - edição bilíngue da Ed. Record

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Bruna artista

http://www.youtube.com/watch?v=SaqdurJtFes

Confiram essa coisa fofa e sapeca que tanto amo. Minha homenagem ao dia das crianças!

Béééé de mãe coruja.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Palavras desenhadas

Escrever é muito difícil
Porque as palavras ficam aí, eternizadas
(ou quase)
Para além do nosso tempo
Aliás, para muito além de mim
Já que dependem e só de fato fazem sentido
Na interpretação alheia
de cada um
Independentes do sentido em que são escritas

Danadas!

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A outra coisa

Falei que tinha duas coisas pra postar aqui hoje...
A primeira foi a frase sobre a alegria que me rendeu umas palavrinhas sobre mim.
A segunda é o lindo poema do Vinícius, que acho que é algo que deve ser compartilhado com quem curte poesia.

O POETA
- Vinícius de Moraes

"A vida do poeta tem um ritmo diferente
É um contínuo de dor angustiante.
O poeta ó o destinado do sofrimento
Do sofrimento que lhe clareia a visão de beleza
E a sua alma é uma parcela do infinito distante
O infinito que ninguem sonda e ninguem compreende.

Ele é o eterno errante dos caminhos
Que vai, pisando a terra e olhando o céu
Preso pelos extremos intangíveis
Clareando como um raio de sol a paisagem da vida.
O poeta tem o coração claro das aves
E a sensibilidade das crianças.
O poeta chora.
Chora de manso, com lágrimas doces, com lágrimas tristes
Olhando o espaço imenso da sua alma.
O poeta sorri.
Sorri à vida e à beleza e à amizade
Sorri com a sua mocidade a todas as mulheres que passam.

O poeta é bom.
Ele ama as mulheres castas e as mulheres impuras
Sua alma as compreende na luz e na lama
Ele é cheio de amor para as coisas da vida
E é cheio de respeito para as coisas da morte.
O poeta não teme a morte.
Seu espírito penetra a sua visão silenciosa
E a sua alma de artista possui-a cheia de um novo mistério.
A sua poesia é a razão da sua existência
Ela o faz puro e grande e nobre
E o consola da dor e o consola da angústia.

A vida do poeta tem um ritmo diferente
Ela o conduz errante pelos caminhos,
Pisando a terra e olhando o céu
Preso, eternamente preso pelos extremos intangíveis..."



Adoro esse poema, acho-o lindo demais e me identifico!
Qualquer dia escrevo sobre essa coisa de ter alma de poeta e ser um tanto outsider...
Almas diferentes? Nem tanto, talvez o jeito de se posicionar ante a vida e de falar dela, de se expor. Isso com certeza. Mas esse papo fica pra outro dia. hahahaha :-D

Um brinde aos poetas! Bééééé! Inté.

Inspiração

Ando sumida daqui, eu sei. Gostoso é receber e-mails de amigos, cobrando. :-)
Mas não sumi para me valorizar e receber este carinho... risos

É mesmo total falta de tempo. Tenho me dedicado intensamente ao meu trabalho e à minha filha, as duas coisas que me movem nesta vida atualmente. Então, está faltando tempo e disposição de vir aqui compartilhar com vocês minhas "viagens".
Mas achei duas coisas que posto hoje para compensar o sumiço.

Uma é a frase que ganha ares de ironia por ter sido dita por quem foi...

"A alegria é a saúde da alma". Santo Hilário

Esta frase é uma ótima definição de mim mesma. Se não fosse a minha alegria (sorte ou benção que tive ao nascer, pois acho que ser alegre é algo que não se constrói, é um presente divino que nasce com a gente) eu nem sei o que seria de mim. Disposição de encarar as adversidades com bom humor, gostar de gente, querer rir de tudo. Ter sempre um sorriso até para a careta mais carrancuda ou no momento mais difícil. Sorrir para o desconhecido e para os desconhecidos, sorrir, ser alegre.
Eu sou muito assim e acho que é esta alegria que compensa as dores da alma, que cura os momentos de tristeza, que me faz levantar, persistir e seguir em frente, adiante.

A alegria é o meu remedinho diário.

Em tempo: sempre quis fazer uma tatoo em mim onde eu escreveria "alegria e liberdade" no meu pé, por entender que são as bases do meu ser. Com o tempo, descobri que não sou nada livre, embora deseje muito a liberdade. Mas de fato não me liberto de várias amarras... Mas isso é papo pra quando eu tiver um tempo maior de escrever. O que vale é que hoje em dia a vontade de fazer a tatoo persiste, mas para ser honesta (comigo mesma, óbvio) e fazer sentido, teria só a palavra "alegria" no meu pé, por entender que a minha alegria é a base de tudo, é a base do meu ser e a minha grande sorte na vida. :-)

Be happy!

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Cultura e Mercado | para quem vive de cultura. » Cultura e Mercado no TOPBLOG 2010

Falando no CeM, vale pedir a colaboração dos amigos, né?

Votem em nós!!! :-)

Cultura e Mercado | para quem vive de cultura. » Cultura e Mercado no TOPBLOG 2010

Quando o papo é sério...

... eu escrevo no Cultura e Mercado.
Quando é para "falar" e pensar a cultura, mando meus artigos pro CeM.

Eis o link direto para os meus textos já publicados:
http://www.culturaemercado.com.br/author/danitorres/

Visite, leia e comente direto lá no site, por favor. O debate é a "alma do negócio" para este veículo e as contraposições de opiniões é que enriquecem o diálogo (e para mim são um grande exercício de pensamento e escrita).

Bééé! Inté.

domingo, 15 de agosto de 2010

Casa Vazia

A casa vazia
As paredes sujas
O silêncio e o vento
Como únicos habitantes
Poeira e odor de mofo
O espelho de sol na parede
A cadeira de balanço que não se move mais
E um imenso vazio
Nada mais
Fechando os olhos
É possível que os ouvidos
Escutem velhas risadas e gargalhadas
De um tempo que não mais existe
Das bocas que não mais se encontram
Das vozes que não estão mais presentes
Partiram no tempo
Ausências sentidas
Resta a casa quase vazia
Suja e silenciosa
Resta a memória
Aquela que não nos abandona
Acabou a família
Restam lembranças

Tua presença na cama



Passo horas a te olhar
Encantamento
Admiro seus olhos fechados
Beijo suas mãos estendidas
Adoro sentir sua pele
Me enrosco em você
Mas não durmo
Quero ficar a te olhar
Admirar sua respiração
Olhar pra sua boca
Desejar te ter assim para sempre
Ficar ali e deixar o sempre acontecer
Esta eternidade que é um momento
Feliz
Este momento fugaz que é eterno
E assim ter você só pra mim
Por toda uma vida
Que são só alguns minutos ali
A te olhar, apaixonada

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Meu avô - parte 1: a relação

Provavelmente todo mundo que me lê por aqui, como são amigos, já sabem que meu avô partiu desta vida neste final de semana. Fui para o Rio participar de seu sepultamento, por uma última despedida e para dar força ao meu pai, pela enorme perda que deve ser pra ele.

Várias coisas me inspiraram a escrever durante o dia deste sepultamento, segunda, 2/08/2010.

Primeiro, sobre a minha relação com meu avô, o único que conheci, pois o pai de minha mãe faleceu antes do meu nascimento. Vovô era também o último dos meus avós vivos, já que perdi as minhas avós muito cedo: a mãe de minha mãe com dez anos e a mãe do meu pai com 14 para 15 anos. Lá se vão + de 20 anos sem as avós... Isso é uma carência incrível na vida de uma pessoa, né? Avós são seres especiais, fazem falta. Ainda assim, tenho grandes e ótimas memórias das minhas duas avós, da infância na casa delas, dos carinhos especiais e exceções ou mimos que cada uma tinha para comigo. Já com meu avô, eu quase não tenho memória da presença dele na minha infância. Embora saiba que ele estava sempre ali, nos domingos na “casa da vovó”. Mas não me lembro de nenhum carinho especial, fala, brincadeira ou momento nosso. Já na adolescência, a memória é a de uma certa mágoa. A do avô que não me dava bola. Explico: meu avô sempre numerou os netos por ordem de nascimento, sendo a minha irmã a número um, meu primo Igor o número dois, eu a número três. Roberta, Renata e Fernanda são respectivamente as netas 4, 5 e 6. Mas essa numeração dizia mais do que a ordem de chegada. Minha irmã era a “número um” no coração do meu avô. Igor era o único neto homem, chegou a morar com meus avós, também tinha seu destaque: no. 2 Daí pra frente éramos as outras, o resto das netas. Sem exagero, meu avô não dava muita bola pra gente, não era exatamente carinhoso e gentil. A lembrança da adolescência é a da fase em que eu passei a reparar isso: que ele passava por mim direto, sem cumprimentar, para ir falar com a minha irmã. Era como se eu não existisse. Acabou virando piada este comportamento dele, a gente (pq não era só eu quem reparava) fazia galhofa e eu provocava ele: “ei, tô aqui hein?!!” e fazia ele vir falar comigo. Só quando eu já estava na faculdade, namorando um rapaz de apelido Lico, ele começou a prestar mais atenção em mim. Pela coincidência do apelido do namorado ser, segundo ele, o mesmo apelido de infância do meu tio Itamar, seu filho preferido (sim, meu avô tinha dessas coisas com os filhos também). Ele tinha uma simpatia natural pelo Lico e aí, eu fui entrando nas conversas, por tabela. Aos 81 anos de idade, teve um aneurisma na horta abdominal e foi operado de emergência. Foi lá pra casa se recuperar e então nos aproximamos um pouco mais, eu ajudando a cuidar dele. Passou a me chamar carinhosamente de “espingardinha” ou “espoletinha”, em referência à criança sapeca que eu fui. Como eu já estava um pouco mais velha, as mágoas de adolescência já não eram mágoas, apenas memórias e só então passamos a ter uma relação um pouco mais carinhosa. Eu já com meus 20 e poucos anos. Ele acima dos 80.

Quando ele completou 90 anos e ninguém se animou a comemorar, organizei a festa na minha casa, na Tijuca, já namorando o Daniel (ainda não éramos oficialmente casados). Organizei uma festinha caseira bem bacana, convidei os filhos a dividirem os custos comigo, usei argumentos fortes com os netos que ameaçaram não aparecer (justamente aqueles que mais exploraram meu avô) e consegui reunir todos os filhos e netos e a maioria dos bisnetos, mais amigos próximos da família na comemoração surpresa de seus 90 anos. Ele ficou feliz e me agradeceu com a ênfase da repetição que só quem conheceu meu avô vai saber entender o modo como ele me disse “neta, muito, muito obrigada. Muito obrigada mesmo, viu?” Fofo. Meio tarde, mas eu ainda aproveitei a “vovôternidade” do Seu Almeril.

Coincidências ou empurrões da vida, fui sua vizinha ali na Tijuca. Ele morava na rua de trás. Embora tão próximos, eu confesso que quase não passava lá para vê-lo. Trabalhava na Vale, viajava muito e não tinha o famoso “tempo”. Mas sempre que eu estava pelo bairro, passava para dar uma conferida e era quase certo encontrá-lo na rua, tomando um café no boteco da esquina ou indo à loteria ou simplesmente vendo a vida passar à sua frente na calçada, solitário e nitidamente entediado.

Às vezes também o encontrava no flagra, fazendo mercado para as “namoradinhas” dele. Meu avô era um homem generoso. Ajudou muito alguns filhos e netos, financeiramente, até o final da vida. E era um “velho bobo”, assanhado, digamos assim. O “rei” das camelôs e domésticas da Tijuca. Elas lhe davam um pouco de bola, ele se achava podendo alguma coisa ainda e elas se aproveitavam dele. Arrumou dívidas no fim da vida por conta de uma delas, a quem deu até carro. Mas não era falta de lucidez, não estava gagá. Era só uma certa inocência que volta com a idade avançada, uma ilusão comprada com o dinheiro. Bobagem.

Perdi muitas histórias do meu avô, certamente. Sei mais sobre ele do que ouvi falar do que ouvi ele mesmo contar. Quando ele foi internado há um mês atrás, me dei conta de que talvez por sua longevidade, a gente se acostumou tanto com a presença dele que já nem contava mais com a sua partida, dá pra entender esta sensação? Acho que a gente já via meu avô como Highlander, imortal; que ia ficar aí, vendo a gente partir. Quando soube a gravidade do caso, me dei conta da sua fragilidade e da proximidade de sua partida. Lamentei não ter aproveitado mais. Sem culpa e sem mágoas. Havia só que se lamentar um tempo que não teríamos mais disponível e que perdemos, nem sei por quê.

Meu avô - parte 2: a partida

A segunda inspiração pra escrever é a própria vida do meu avô, sua longevidade e sua morte, relativamente tranqüila. Uma transição diferente do comum para uma pessoa que, sem dúvida, teve muita “proteção” a vida inteira. Conversava ontem com meu primo-irmão Rodrigo e minha mãe sobre a força da fé. Talvez isso tenha feito com que ele fosse tão protegido: meu avô não sentia dor alguma. Teve câncer e só descobriu porque começou a ter sangramentos, que o levaram a algumas transfusões de sangue. Dor? Nem sinal. Operou, ficou bem da cirurgia, mas seu coração já não batia com força suficiente para fazer funcionar seus órgãos vitais, como rim e fígado. Foi pifando. Já internado, não sentiu esta falência. Não sofreu nem dor e nem a consciência da partida, devido à sedação pós cirúrgica. Foi rápido o suficiente para que não sofresse, não agonizasse. Foi lento o suficiente para que a família percebesse que era chegada a hora e se conformasse, torcendo para o melhor desfecho para ele. Parou. Meu avô era muito independente e se manteve lúcido até o final da vida. Não ia suportar ficar doente, dependente, na cama de hospital ou na casa de algum filho. Morava sozinho até uns 2 ou 3 anos atrás! Dá pra imaginar um senhor de 90 anos sozinho? Só aceitou ter um acompanhante em casa depois de muita, muita insistência dos filhos (devido à idade avançada dele, todos temiam que ele sofresse algo sozinho em casa, sem ter quem o socorresse). Mas só aceitou depois levar um ou dois sustinhos: de sentir falta de ar, alguma dificuldade para andar ou uma tontura pra sair da cama. Aí reconheceu a sua fragilidade e aceitou que alguém dormisse com ele em casa. Mas deixar de morar sozinho, jamais! (risos) Ah, e tinha que ser mulher: dormir com outro homem em casa, nem pensar! (+ risos)

Falei com ele pelo telefone pela última vez no dia 26/07, dia dos avós. Ele me ouviu ao telefone, agradeceu rindo a ligação, achando divertido eu ligar pelo “dia dos avós”. Agradeceu o carinho e perguntou pela minha filha. Lúcido, lúcido. Aos 93, quase 94 anos (faria em outubro). Tudo bem, eu tive que berrar um pouco ao telefone, mas o velho estava inteiraço pra quem estava com tanta estrada percorrida, um puta câncer (estômago, baço, pâncreas), entupimentos nas veias, coração grande e lento... Nem parecia. Estava já internado, era véspera da cirurgia pra retirada do câncer. Depois não tivemos mais oportunidade de nos falarmos. Mas foi uma despedida bacana entre nós.

Meu avô - parte 3: a religião e a despedida

Por fim, outro motivo de inspiração foi o ritual de despedida do meu avô. Ele pediu para ser sepultado na “irmandade” onde atuou por 71 anos (descobri esta data hoje). Eu sabia que ele era espírita, que freqüentava este lugar em Guapimirim onde sempre se referia como “irmandade”, sabia que era devoto de São Jorge pela história do nome do meu pai... Mas eu não tinha noção do que era esta irmandade, de quem era o meu avô lá. Curioso que ele nunca atuou missionariamente em família: nunca nos convidou a ir lá, nunca nos estimulou a fazer parte de sua religião. Nunca. E que impacto teve esse dia de hoje! Cheguei à conclusão que não conhecia mesmo o meu avô. Havia ali uma outra vida, um outro ser, tanto que até outro nome ele tinha lá: Zairths. Confesso que eu tinha curiosidade de saber como seria seu enterro, por saber que ia ser nesta irmandade da qual ninguém da família sabia muita coisa. O lugar é como um sítio, com riacho. As várias casas abrigam muitas capelas, muitas imagens de santos católicos, uma tenda em homenagem a um preto velho, muitos números escritos em locais estratégicos (alguns se repetiam mais vezes como 33, 777), triângulos, estrelas de Davi, desenhos de planetas. Numerologia, astrologia, umbanda, catolicismo, kardecismo, kabala, maçonaria... A impressão que dá ao visitante leigo é que a “irmandade” é uma espécie de seita, uma religião baseada numa grande mistura de várias outras religiões. Bastante confuso para quem não conhece.

Se intitulam “Irmandade Espiritual Estrela Dalva”. O local é chamado de Cidade Wandú e também se nomeiam “Maçonaria Oriental Wanduísta”. Foi fundada pela senhora Maly-Hilda em 1938. Uma placa no local traz os nomes da fundadora e de seus discípulos, com seus respectivos “cargos” e nomes na Irmandade, pois ali dentro todos passavam a ter nova identidade. Meu avô era o único que ainda estava vivo na lista da placa, com cerca de 15 ou 20 nomes. E seu cargo de “guardião de honra” listava no topo, abaixo apenas da fundadora e de um outro cargo cujo nome agora não recordo. Além desse cargo expresso na placa, seus companheiros presentes no cerimonial do enterro o chamaram também de “reverendo IED” e “sacerdote Zairths” várias vezes durante a estranha cerimônia que presenciamos.

PARENTESE: [quando me refiro ao meu estranhamento, é pelo total desconhecimento da existência daquela instituição. Não faço nenhum tipo de julgamento, até porque, eu entendo que aquela, como TODAS as religiões, é feita POR homens e para os homens. Portanto tem defeitos e interesses como qualquer ser humano. Mas também, como toda religião, pretende ser algo do bem, que faça as pessoas serem melhores, seja aqui mesmo ou na vida espiritual. Que agrega pessoas em torno de certos valores selecionados pelo próprio grupo, pessoas com uma identidade comum em prol de alguma causa, geralmente. Vejo isso positivamente, não há preconceitos ou julgamentos na minha fala. Apenas estranhamento, no sentido mais pleno da palavra, o do desconhecimento sobre algo e da percepção da novidade.]

O sepultamento tem uma série de rituais. Uma sequência que começou às 10h e acabou depois das 13h. Mas o que vale destacar é o local onde ele ficou. Onde, nem sabíamos, mas era onde ele TINHA que ficar. Ainda bem que ele nos disse antes de partir onde gostaria de ser enterrado. A Irmandade tem um pequeno cemitério, no lado esquerdo da estrada de quem vai à Teresópolis, logo depois da entrada de Guapimirim, quase em frente ao portal de entrada da cidade. Um lugar que não se vê da estrada, não se vê nada de lugar algum. Escondido entre a vegetação, um local bonito guarda os membros da Irmandade, sendo que há um platô mais alto, onde está sepultada a fundadora, com um imenso e belo jazigo de mármore branco. Ao seu lado esquerdo, um jazigo bem mais simples e menor, de seu marido. E acima dela na colina, dois túmulos: para os dois guardiões de honra da Irmandade que passariam ali a ser também guardiões da fundadora. Um deles já estava ocupado pela outra guardiã: uma senhora já falecida e o outro estava à espera do meu avô! O lugar mais alto da colina, como guardião da fundadora, lhe aguardava. Ocupar esse lugar não era apenas ter onde repousar, entendi ontem... Ele tinha uma missão a cumprir mesmo após a morte. Sua inserção ali como guardião é mais uma etapa de sua jornada na Irmandade, uma etapa pós vida. Uma missão espiritual. Por isso ele avisou que queria ir pra lá. Ele tinha que ir pra lá. Um bonito lugar, uma história interessante, quase encantadora para quem ali estava descobrindo todo um novo universo.

Como se não bastasse tantos motivos inspiradores para compartilhar esta experiência com vocês, ainda teve o discurso de despedida de um dos companheiros de Irmandade do meu avô, contando a história de sua entrada na instituição, de como conheceu a fundadora e se “apaixonou por ela”, “uma história de amor”, disse o sujeito. E não pareceu falar no sentido figurado. Conhecendo o interesse do meu avô pelas mulheres e sabendo que a tal fundadora era uma pessoa bastante erotizada, ou nas palavras da “super sincera” minha mãe: “uma mulher que só falava sacanagem” como assim a definiu por tê-la conhecido pessoalmente na década de 60... Dá para imaginar meu avô tendo um caso com a tal Maly-Hilda. Meu lado barraqueira teve um segundo de revolta no meio daquela despedida, afinal achei aquele discurso sobre o amor dos dois uma sacanagem com a minha avó. Mas ela já faleceu há 20 anos, já deve estar bem evoluída e nem um pouco interessada nas aventuras do meu avô no plano físico. Silenciei, calei a barraqueira e, automaticamente o meu lado romântico novelístico veio à tona. Imaginação de escritora? Sei lá, mas lembrei dos livros do Dan Brown: teria aquela seita rituais secretos? Pergunto com o maior respeito, é bom destacar, afinal isto é um texto, vai ficar aí e ninguém está ouvindo minha entonação. Pergunto seriamente, respeitosamente, repito. Será que existem ali segredos maiores do que todas as dúvidas que aquele lugar e todas as representações, textos, símbolos e números ali contidos já nos traziam à mente?

Não entendi nada de todo aquele cerimonial mas respeito. Meu avô dedicou 71 anos de sua vida àquilo. Fundada em 1938, ele se tornou membro em junho de 39 e participou ativamente até sua morte. Seus companheiros o elogiaram muito e nos falavam a toda hora sobre sua importância para aquele lugar e aquela Irmandade. Enfim, foi um dia estranho, cansativo, longo. Tinha a tristeza da despedida e a curiosidade que a novidade das descobertas – ou das não descobertas; das dúvidas suscitadas – trazia. A gente espera, ao menos, ter colaborado para que ele cumprisse sua missão e ter feito sua vontade. Que ele esteja feliz e em paz. Valeu, Seu Almeril.

(Mas ficará a pergunta: quem terá sido Zairths afinal?..)

quinta-feira, 29 de julho de 2010

35 anos

Cheguei aqui com a liberdade de quem pode se comportar como criança de vez em quando.
Com a responsabilidade de quem tem um filho para criar e ser exemplo.
Com a ambição de quem quer fazer o que gosta profissionalmente e viver disso.
Com os desejos de qualquer mulher, de ser amada e amar.
E com a missão aparentemente impossível de conciliar tudo isso, sendo que a maioria das mulheres - nós, comumente especiais - fazemos isso todos os dias sem nem nos darmos conta exatamente de como conseguimos.

Adoro fazer aniversário! Hoje são 35 anos bem vividos, cheios de histórias pra contar, com muitas experiências na bagagem.
E o que mais será a vida além desse acúmulo de vivências?
35 com corpinho de 40 (mas isso tem solução e esperança!), com cabeça de ???? e com experiências de vida suficientes para entreter os netos com muitas histórias.
Ah, sim, eu desejo chegar lá... Nos netos.
Que boa vida eu tive até aqui. Valeu, tá valendo, obrigada!!!

sábado, 17 de julho de 2010

A Idade de Ser Feliz

"Existe somente uma idade para a gente ser feliz,
somente uma época na vida de cada pessoa em que é possível sonhar e fazer planos
e ter energia bastante para realizá-los
a despeito de todas as dificuldades e obstáculos.
Uma só idade para a gente se encantar com a vida
e viver apaixonadamente
e desfrutar tudo com toda intensidade
sem medo nem culpa de sentir prazer.
Fase dourada em que a gente pode criar
e recriar a vida à nossa própria imagem e semelhança
e vestir-se com todas as cores
e experimentar todos os sabores
e entregar-se a todos os amores sem preconceito nem pudor.
Tempo de entusiasmo e coragem em que todo desafio é mais um convite à luta que a gente enfrenta com toda disposição de tentar algo NOVO, de NOVO e de NOVO, e quantas vezes for preciso.
Essa idade tão fugaz na vida da gente chama-se PRESENTE,
também conhecida como AGORA ou JÁ
e tem a duração do instante que passa..."
Mario Quintana

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Mal Secreto

"Onde há frustração, a inveja impera".
Ouvi esta frase recentemente e concordei com ela.

Pessoas frustradas são obviamente mais propensas ao sentimento da inveja. Quem se sente realizado, de bem com a vida, não precisa nem prestar atenção no outro, ao que o outro faz, tem ou sente. Até presta, mas por boa vontade, por amizade, para participar e curtir ou para ser solidário.

Pessoas frustradas e mal resolvidas é que são o "mal secreto" do mundo. Incapazes de se resolver, projetam no outro suas frustrações, não conseguem engolir a felicidade alheia e não suportam ver que outras pessoas são capazes de realizar seus desejos enquanto elas não conquistam o desejado.

Infelizmente, faz parte da vida: eu conheço muitas pessoas invejosas. O mais triste pra mim, não é perceber que o são. Mais triste pra mim é notar o quanto são infelizes e, torno a repetir, frustradas. E na maioria das vezes, nem precisariam ser. Teriam plenas condições de sair da situação (ou situações) que as prendem num universo de infelicidade. Mas se acomodam, paralisam. Por any motivos, parecem desistir de buscar sua felicidade, de tentar realizar e conquistar coisas - sejam de ordem material ou não. Isto é o que mais me penaliza. É observar que poderiam ser felizes, talvez tivessem que fazer um pequeno esforço - sim, e o que seria da vida sem esforço? - mas ao invés disso, ficam ali, imobilizadas. Acabam, naturalmente, se tornando venenosas criaturas que invejam o outro. Tantas vezes, por tão pouco.

Ainda tem a história da grama do vizinho, né? Sempre se acha que a do vizinho é mais verde. Pois é, o marido da vizinha é sempre mais bacana, bonito ou atencioso. O filho da vizinha é mais esperto ou mais obediente. O carro da vizinha, mesmo que seja da mesma marca, é sempre mais bonito ou eficiente. E por aí vai...

Como se ajuda uma pessoa que, de tão frustrada, chegou ao ponto de ser invejosa? Como se diz pra ela: ei, minha grama não é mais verde que a sua, eu apenas cuidei melhor dela. Ou até mesmo: apenas você pensa que é melhor, mas ela é igualzinha. Como?

Eu gostaria muito de ajudar estas pessoas. Até porque, uma coisa a gente tem que admitir, elas atrapalham. De fato, conseguem com seus sentimentos e energia carregados, afetar vidas felizes. Devem sentir um certo gosto de vitória, quando alguém que invejam tem uma derrota em alguma coisa ou momento da vida. (Mas que tolas: e quem é que não tem seus momentos de derrota, se a vida é feita de altos e baixos para todo mundo?!!)

O pior mesmo é identificar estas pessoas para poder eliminá-las ou, se não for possível, manter ao menos uma distância segura delas, em nossas vidas. Uma dica eu posso dar: desconfie sempre das pessoas muito cordiais, que nunca se alteram, nunca levantam a voz, não brigam com ninguém, são sempre tão gentis e nunca se aborrecem com nada nem ninguém. Isto é humanamente impossível. Ou a pessoa é um psicopata, ou ela é falsa, está forjando uma imagem cordata, e isto é comportamento típico de frustrado. Desconfie também daquelas que sempre te elogiam demais, elogiam tudo que você faz, tem ou usa, simulando um interesse mas, na verdade, nunca estão realmente interessadas pelo que você faz, sente, usa ou produz. Este é um tipo peçonhento de invejoso. É o invejoso que queria ser tudo o que você é. E o extremo também costuma ser sinal de alerta: aquele que quer muito ser seu amigo, te agradar, estar bem com você. É o invejoso que te suga, outro espécime asqueroso. E tem ainda o invejoso que corre atrás: é o tipo que ao invés de gastar sua energia em realizações próprias, fica o tempo todo te imitando, seguindo seus passos, fazendo as mesmas coisas que você. Sabe aquela pessoa que compra tudo que você compra igualzinho? Ou faz tudo o que você faz, logo em seguida. Alerta máximo: invejoso descontrolado, que não consegue esconder e te copia os passos na vida.

Mas a boa notícia é que o mundo sempre dá voltas e nada melhor do que o tempo para indicar onde se encontram as verdades, mostrar quem é quem. E como a vida é feita de bons e maus momentos, os invejosos podem até atrapalhar um pouco, mas quem é feliz sempre dá a volta por cima e consegue manter sua vida numa soma maior de bons momentos do que dos maus, que fazem parte, mas podem ser bem poucos. E isso depende só de cada um: de si mesmo. É você quem decide colecionar mais momentos bons do que ruins. É você quem decide se quer ser feliz. Ninguém é feliz o tempo todo, mas você tem o poder sobre o que fazer com sua vida. Faça o melhor. Pra você e pro mundo.

OBS: Inveja - Mal Secreto é título de bom livro escrito por Zuenir Ventura para a coleção dos Plenos Pecados, da editora Objetiva. Antigo mas atual. Vale conferir.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Viagem

Medo
Solidão e dor
Dúvida
Uma força me empurra
O medo me prende
O solo seguro é o grande perigo
O risco é me ouvir
É preciso cuidar
(Eu quero cuidá-la sempre)
Mas preciso de mim inteira
Para ser melhor
Preciso ir mas quero ficar
Tenho medo de ir
Temo ficar

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Definição de mim por Clarice Lispector

Sou composta por urgências:
minhas alegrias são intensas
minhas tristezas, absolutas.
Me entupo de ausências,
me esvazio de excessos.

Eu não caibo no estreito, eu só vivo nos extremos.

sábado, 19 de junho de 2010

Amizades


Uma amiga me procurou porque está passando por um momento difícil, seu marido está com um câncer e embora estejam encarando a má notícia com muita fé, esperança e positividade, é claro que nestas horas a gente quer o "colo" de um amigo.

A notícia me trouxe várias inspirações para escrever, por vários motivos e assuntos. Pensar sobre intuição (na mesma noite em que ela me escreveu eu sonhei com o nosso grupo de amigos...); sobre vida e morte, o tudo ou nada da vida; sobre doenças e o quanto mudamos nossa visão de mundo depois de passar por uma; sobre família; sobre apoio e tristeza. Enfim, muitos temas passaram pela minha cabeça e acabei não escrevendo sobre nenhum deles.

Mas um dado me impressionou (não mais do que a triste notícia, é claro) e desviou a atenção para este outro papo.

Este ano fazem 20 anos que sou amiga desta pessoa de quem estou falando. 20 ANOS!!! Me impressionei com o número. E somos grandes amigas. É tanto tempo (e parece tão pouco, pois me lembro como se fosse ontem)... E aí fiquei pensando sobre amizades e quantos amigos de longa data eu tenho a sorte de ter. Amizades de infância (+ de 30anos!), uma amiga há 25 anos, este grupo de amigos de 20 anos de convívio (meu marido é parte deste grupo, mas chegou um pouco mais tarde: são 18 anos de amizade), amigos de faculdade, amigos nas cidades onde morei, amigos de trabalho... Sem contar os primos-irmãos, a família.

Acho que sou uma pessoa de sorte. Aquela frase lugar-comum que 'amigos de verdade são poucos' ou 'se contam nos dedos' não se aplica a mim. O que eu não acho que seja nenhuma vantagem, não estou aqui "tirando onda", pois pra mim um único bom amigo já faz toda a diferença na vida de uma pessoa. Mas de fato, eu tenho pessoas que me acompanham há muito, muito tempo. Estão sempre ali. Sei que posso contar com elas nas dificuldades. Mas prefiro sempre acioná-las nas alegrias! Mas caminhamos juntos, trocando.

O que eu acho é que amigo não é aquele que está junto com você o tempo todo. Não é preciso ver todo dia, falar 5 vezes por semana... É possível manter verdadeiras amizades com diferentes construções de tempo e participação na vida das pessoas. Com diferentes interações. A verdade do sentimento, o carinho, o apoio mútuo são as bases desta construção. E é claro que ela fica maior à medida que tem presença, sem dúvida.

Fico feliz em ter tão longas e duradouras amizades. Que mais alegrias possam ser compartilhadas, mas que a gente possa também enfrentar juntos os momentos de dor. E que a vida nos traga ainda mais amigos. Por mim, cabe mais!

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Vídeo no link abaixo

http://www.ted.com/talks/lang/por_br/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html

Não se assustem com o tempo do vídeo, GANHEM este tempo em suas vidas. Saber, a gente até sabe, mas nunca reflete sobre e, muito menos, põe em prática. E continua por aí repetindo esteriótipos...

Linda reflexão poética sobre dominação, história, poder, cultura.

"Histórias importam. Muitas histórias importam." Assistam!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

A Primeira Copa a Gente Nunca Esquece

A Primeira Copa a Gente Nunca Esquece OU A Melhor Companhia

Fiquei um pouco chateada ao me dar conta que veria o primeiro jogo do Brasil na Copa sozinha. Sozinha não, em ilustríssima companhia, a da minha filha. Mas confesso que não gostei de ter sido chutada pra escanteio pelo marido, que decidiu ver o jogo de estréia da seleção brasileira com os amigos do trabalho. Pra não cometer injustiça, digo que ele nos “convidou” a ir, na véspera, da seguinte forma: “tem gente que vai levar a família, mas é complicado pra você chegar lá com a Bruna, o metrô vai estar cheio, é tumultuado, muito longe”. Bem nítido que colocou todos os empecilhos para nos desestimular a fazer qualquer movimento naquela direção. Ok. Dormimos, mas acordei com aquele sentimento de solidão que bate nestas horas em que todo mundo se junta com alguém em algum lugar pra ver o Brasil entrar em campo e você se dá conta de que deve ser o único brasileiro que não tem pra onde ir. Logo eu, super festeira, animada pra bagunça, não ia ter com quem compartilhar, afinal, ainda não tenho amizades de trabalho tão íntimas por aqui e a família está distante (tenho um casal de primos aqui, mas eles têm os compromissos deles, a turma deles; além de morarmos bem distantes).

Mas ao acordar, decidi então que teria um ótimo dia com a filhota e que aproveitaria a parada do país para ficar com a Bruna. Avisei na creche que nem ia levá-la, deixei-a dormir até a hora que quis e, enquanto isso, trabalhei um pouquinho. Brincamos na cama quando ela acordou, a farra começou. Tomamos café da manhã e banho juntas. Pusemos muitas roupas para aplacar o frio de SP e fomos à rua pegar um solzinho. Ela brincou na área de lazer aqui perto e depois foi comigo ao mercado. Voltamos para almoçar e enquanto ela via desenhos, eu consegui trocar mais alguns e-mails, resolver uma coisa ou outra pelo computador. Alguns minutos antes do jogo começar, eu já estava ensaiando com ela. Fizemos muito barulho, batendo pás e panelinhas, baldes, todos os brinquedos dela que podiam virar percussão, gritando “Brasil! Brasil!” E muitos gritos de “goooolll!!!” Bruna entrou no clima e estava animada com a agitação provocada por mim. Achou tudo muito divertido. Ria, dançava e pulava. O jogo começou e continuamos a fazer nosso barulho e farra. Depois de uns minutos de apreensão e tédio com o jogo ruim e sem gols, Bruna resolveu a questão: foi no quarto apanhar a sua bola e começamos nós duas a jogar, quase como se ela dissesse “ah, esse jogo aí tá ruim, vamos fazer o nosso que é melhor”. No intervalo preparei pra ela um suco de laranja natural e pipoca pra nós duas. Como continuamos a farra com a bola, acabamos fazendo um golaço antes do Brasil: acertamos o balde de pipocas e fizemos uma lambança fenomenal na sala! Saíram os gols e a Bruna resolveu imitar o barulho das buzinas que ouvimos daqui. “Bi bi fón fón” Nos últimos minutos, estávamos já cansadas da farra, assistindo ao jogo deitadas no sofá, agarradinhas. Depois do jogo eu arrumei a bagunça enquanto ela dormia e fiquei pensando o quanto foi divertido e gostoso ficar sozinha com ela pra ver o jogo. Tem melhor companhia no mundo?

Quando o pai chegou, ela deu logo os “instrumentos de percussão” pra mostrar a ele como torcer e mostrou como gritar “gol” e “Brasil” com as mãos pra cima. Ao final do nosso dia, no meu momento de oração (sim eu faço isso!), me senti grata. Ao mesmo tempo em que eu sofro com a falta de independência e me incomodo muito com a lentidão natural que se leva para se sair dessa situação, de forma empreendedora, tendo que reconstruir uma carreira após dois anos fora do mercado e chegando num mercado de trabalho novo, ainda por cima sem nenhum apoio ou suporte; eu me sinto muito feliz de poder ter as rédeas dos meus horários e poder tirar um dia para pular, cantar, gritar, fazer bagunça e torcer pro Brasil com a minha filha.

Eu não sei se ela vai lembrar da sua primeira Copa do Mundo quando crescer, afinal é ainda muito pequena (2 aninhos recém-completados), mas eu não vou esquecer jamais da Primeira Copa do Mundo com a Bruna.

domingo, 13 de junho de 2010

Mensagem bonita

Vejam o vídeo no link abaixo... (não consegui postar o vídeo diretamente aqui)

Eu sempre acho estas imagens sobrepostas em ppt super cafonas e tenho lá minhas dúvidas se este texto é mesmo do Fernando Pessoa, mas estou sem tempo pra pesquisar se é verdade ou não.

O que importa é que achei a mensagem bonita, me identifiquei e resolvi, por isso, compartilhar aqui. Confiram pelo link.

Bééé!
Inté.

http://www.youtube.com/watch?v=b9eQp-z2zjs

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Cultura do Futebol no "País do Futebol"

Pensei em intitular este texto como "somos todos idiotas?", mas depois achei agressivo demais.
Seria a paixão brasileira pelo futebol uma questão cultural?
Ou somos todos influenciados pela mídia, sempre tachada por pseudo cronistas - como eu - de vilã da história.
Mas afinal, é a sociedade que pauta a mídia e a faz transformar o futebol no assunto central de todas as conversas em tempo de Copa do Mundo ou somos mesmo influenciados por ela a entrar na onde futebolística?
Eu sei que todo ano de Copa eu faço o mesmo discurso: não vou participar, não quero saber. Acho um absurdo o país parar por causa de um campeonato de futebol e nem quero saber quem foram os convocados. Não leio o caderno de esportes do jornal e sigo antipática e convicta na minha certeza de que não vou cair em tentação e não vou torcer.
Mas chega o primeiro jogo e, inexplicavelmente, lá estou eu parada em frente à TV, angustiada, sofrendo, berrando - me esgoelando, pra ser mais precisa - torcendo. Seria amor ao meu país? Não sei explicar qual o vírus que me contamina, mas sei que este ano resolvi ser um pouco mais sincera comigo mesma: há uma semana da Copa*, continuo sem saber a escalação do time e sem ler o caderno de esportes, mas comprei um boné verde e amarelo escrito BRASIL bem grande na testa.
* = escrevi este texto no meu iphone, alguns dias atrás e só hoje - dia da abertura oficial da Copa - postei aqui.

Tomei coragem



Escrever é se expor.
Escrever é se separar...
Escrever é um exercício de pensamento.

O que se escreve fica gravado, o que não significa que as opiniões sejam estáticas como letras impressas. Elas mudam.
Aí temos que escrever de novo. Reescrever.
Repensar. Se expor de novo.

E lá vou eu nessa aventura!

Mistura de antigo desejo e medo, excitação alegre de quem estréia e ansiedade séria de debater.

Aqui eu brinco, desabafo, vomito sentimentos.

Cultura e Mercado é um trabalho sério e respeitado, há mais de 12 anos no ar. Responsabilidade...

Está lá no site Cultura e Mercado, publicado pela primeira vez, um texto meu. Pensando o financiamento à cultura brasileiro a partir de uma provocação de um antigo texto, do mesmo site. Confiram e opinem.

Aguardo vocês por lá (e por aqui também).
Bééééé de ovelha, bjs de Dani.

Link direto pro meu texto:
http://www.culturaemercado.com.br/ideias/a-arte-e-o-mecenato-brasileiro/

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Cena vivida

Um dia corrido o de ontem e o metrô estava bem cheio embora ainda fosse meio de tarde em São Paulo.
Um grito estranho - mais parecia um grunhido muito alto - dentro do vagão e correria. Abre-se uma clareira improvável dentro do vagão e, nela, um homem estendido no chão, muito vermelho, se debate. Era um homem enorme. Ao contrário do instinto da maioria das pessoas ali presente, fui em sua direção e gritei "convulsão" para que as pessoas parassem de correr com medo e se aproximassem para também ajudar. Mas não fiz muito mais que isso também, sem saber como agir. Pensei na língua do sujeito, mas não era um ataque epilético e a grande verdade é que eu também, além de não saber como ajudar, embora tivesse o instinto de amparar aquela pessoa; eu também temia. E não tinha a menor certeza do que estava acontecendo. Milésimos de segundo e mil coisas passam pela cabeça. Drogado? Palhaçada? Ataque epilético? Convulsão? Poderia ele ficar agressivo e ser violento? Nesses poucos segundos a vermilhidão do sujeito se desfez e era possível perceber que ele não se sufocava. Respirava. Foi encolhendo. Aquele homem enorme foi se encolhendo todo, parando de tremer. As mãos estavam machucadas do impacto no chão e possivelmente na barra de ferro do metrô, durante a queda. Dois homens jovens se aproximaram. Só eu e os dois homens nos mantínhamos próximos ao sujeito enorme que agora era um pequeno ser encolhido, babando muito. Não saberia dizer se ele se encolhia por vergonha ou se era parte do que sentia o que lhe fazia se embrulhar em si mesmo. Um dos rapazes me deu sua mochila, sem dizer uma só palavra, para que eu segurasse. Eu também nada disse. Os dois homens então conseguiram carregar e levantar o sujeito. As portas do metrô apitavam: outra estação. Saíram os três. Os rapazes o colocaram no chão do lado de fora do vagão e um funcionário do metrô já se aproximava. Aquele homem enorme continuava sem conseguir se erguer e babando. Piiiiiiiiiiii. Novo apito, as portas vão se fechar. Só então consegui pronunciar algo novamente: "moço, sua mochila". O rapaz a pegou e entrou no vagão. O outro também voltou para o vagão e o homem convalescente ficou ali fora, no chão da estação, com o funcionário do metrô. Ninguém disse nada. Ninguém sabia nada. As portas se fecharam e as vidas se seguiram, cada uma em sua direção. O vagão já não tinha espaços vazios novamente. Mas estava vazio de sons.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Dois



Amor, encantamento e paixão: a intensidade de uma relação que, além de não ter explicação, não tem medidas. Tampouco podem expressar as palavras (coitadas) o que se sente no olhar ou em trocas delicadas.
Afetos e cuidados transformaram nossa doce rotina numa mistura de sonho com uma realidade repleta de ternura. Por mais que a desejasse, jamais poderia supor que tão intenso seria o nosso encontro. E ao caminharmos juntas, aprendendo uma com a outra, descobrimos que tudo pode ser ainda maior e muito mais belo! Sorrisos e lágrimas hão de nos unir por uma longa estrada cuja caminhada mal começamos - e já são tantas as histórias, recordações, emoções. Impossível registrar ou descrever.
Hoje é o dia pra comemorar e agradecer: Bruna, há dois anos eu amo você!

As memórias deliciosas da nossa convivência


Os primeiros passos
A primeira palavra
O primeiro sorriso
A primeira malcriação
O primeiro dodói
A primeira gargalhada
O primeiro grito
O último peito
A primeira dor
O brinquedo preferido
A primeira febre
O primeiro piscar de olhos
A primeira escolinha
O último cheirinho
A primeira meleca
Um barulinho à toa
O cobertor para o frio
A boneca preferida
A melhor amiguinha
A piscina querida
O bichinho encantador
O cocô e o xixi
As sonecas
Os abraços - ah, os abraços!... -
O primeiro beijinho
O último corte de cabelo
A primeira manha
E o famoso dengo
Todos os nossos momentos
Nossas mãos cruzadas no papel
O primeiro desenho
Os pés entrelaçados
A brincadeira na cama
Os sims e os muitos nãos
O medo
O choro
A oração
O silêncio
As fotos
As brincadeiras
A correria
As canções
As danças
As palminhas
E as gracinhas
O brilho nos olhos e o amor intenso
E tudo que ainda será escrito
e gravado em meu coração
Na minha alma
De nossos carinhos, de nosso convívio

sábado, 22 de maio de 2010

Mistério

Pra onde foi a delicadeza?
Onde está o que me encantava em você?
As palavras sutis, bem colocadas
Os gestos calmos, firmes, serenos
O galanteio
A romântica falsa timidez?
Onde foi parar a gentileza?

Onde se perderam as promessas feitas?
Quando nos perdemos das promessas feitas?
Onde nós perdemos as promessas feitas?

domingo, 16 de maio de 2010

Virada Cultural


Começou há pouco a virada cultural de SP. A publicidade do evento diz que são 24 horas de cultura. Será mesmo?

Certo é que são 24h a 8 milhões de reais. Ok, vamos mudar a conta: 1.000 eventos (segundo a organização) a R$ 8 milhões. Isto daria uma ótima média de R$ 8.000,00 por evento; valor baixo em se considerando que custos de ações culturais como shows musicais costumam ser altos: transporte, hospedagem, cachês, equipamentos de som, luz, técnicos, palcos e por aí vai – longe. Ainda assim, opino que é um recurso muito desperdiçado.

Três coisas precisam ser levadas em consideração: a primeira é que nem todo evento que é anunciado como sendo da Virada Cultural é bancado pela Virada, o que já fura as contas feitas acima. A segunda consideração importante a se fazer é a comparação entre o orçamento anual da Secretaria Municipal de Cultura e o evento. Bem que tentei encontrar a informação sobre o orçamento da Cultura no site da Prefeitura de SP, mas depois de alguns minutos sem sucesso, desisti. Mas segundo o jornal Folha de SP, o evento consome em um dia o orçamento anual da área (programação) na Secretaria Municipal de Cultura. Ou 10% do orçamento global da Secretaria incluindo aí manutenção de corpos artísticos, patrocínios, etc. Em um dia. E um dia de quê? E este é o terceiro ponto para o qual gostaria de chamar atenção. De que cultura estamos falando?

Sobre as atrações da Virada

O que não está explicado - ao menos não vi divulgado em nenhum lugar -, são eventos de Centros Culturais que já estavam programados/em realização e que ocorreriam normalmente este final de semana, havendo ou não Virada. Mas eles estão contabilizados dentre os “mil”. Não são projetos feitos para a Virada. Foram tão somente incorporados. Alguma verba foi destinada a estes eventos? Então deveriam ser contabilizados nas “mil atrações”? Dou exemplos: bibliotecas foram inclusas no pacotão como se fosse algum evento especial elas abrirem ao público este final de semana. A interessantíssima peça de teatro da Beth Goulart sobre Clarice Lispector já estava em cartaz no CCBB mas está citada na programação da Virada. Não ficou claro se os ingressos deste final de semana serão subsidiados pela Virada.

Aliás, clareza é uma coisa difícil de encontrar no site oficial, que eu pesquisei. Os textos do site são péssimos, mal escritos ou que não dizem nada sobre a Virada – ou talvez por isso mesmo digam muito a respeito da não existência de um critério claro e bem definido. Falta uma curadoria decente. Ou se abre para inscrição indiscriminadamente e tudo é aprovado até se atingir o valor do orçamento ou se tem uma curadoria com uma linha curatorial definida, um objetivo, um tema ou questionamento. Chamar essa coleção de “eventos” de curadoria é ofender alguns sérios profissionais. Aliás, os organizadores da Virada confundem tatoo com body art! Só o fato deles chamarem as atrações de “eventos” pode ser também um indicativo interessante. O que me parece, é que a Virada Cultural está mais para entretenimento do que para cultura. Mas este é o terceiro ponto que chamei atenção na minha introdução.

Cultura X Entretenimento X Lazer

Afinal o objetivo da Virada Cultural é promover a arte e a cultura ou oferecer um final de semana de lazer ao povão? Embora estas coisas possam se misturar, são objetivos bastante diferentes.

Façamos algumas perguntas, dando especial atenção à extensa lista da programação que pode ser conferida em http://viradacultural.org/programacao :

Todas as manifestações artísticas estão contempladas na programação? Dentro de cada manifestação artística, todos os estilos estão contemplados? Não e não. Fazem falta na programação grupos e artistas novos, novas manifestações. A programação gira em torno de música, teatro, dança, cinema, exposições. Não contei, porém mais de 70% das atrações são de música. A Virada é uma grande coleção de shows. Gastronomia? Um evento pago e os melhores pastéis de SP em barracas próximas aos palcos. Circo? Quase nada. Nem o novo queridinho da mídia, o grafite, aparece. Hip-hop e rap, manifestações genuinamente de rua, não estão contemplados na Virada. Museus? Dois. Literatura? Saraus de poesia, rodas de leitura, debates: ações que praticamente não precisam de recursos, não foram promovidas nesta edição. Quase nada de atividades para crianças. E se fala em formação de público...

Double You e Living Coulor são algumas das atrações alardeadas. Sem xenofobia, que não é a minha praia, mas as atrações a serem promovidas pela Secretaria Municipal de Cultura não deveriam ser nacionais? Muitos nomes consagrados, pouca experimentação. É bacana ter nomes consagrados se apresentando na rua, gratuitamente, pois geralmente a maior parte da população não teria acesso a shows destes grandes nomes. Ok. Mas e o estímulo aos novos artistas?

Eu vejo distorções muito claras nesta programação toda. Um dos eventos dentro da programação se chama “Dimensão Nerd”. Reúne quadrinhos, RPG e Cosplay... Eu concordo que HQ é cultura mas parei aí. RPG é jogo, entretenimento. Cosplay é o entretenimento do entretenimento. Porquê não nos fantasiarmos no samba, promovermos um desfile de bloco de rua, então? Acho que estaríamos mais dentro de uma proposta cultural. Estou sendo radical? Então me explica porque o bar que toca samba sempre vai ter especialmente no final de semana da Virada um campeonato de dominó (e não vai ter o samba)?! Está lá na programação da Virada: campeonato de dominó. Vamos pensar a cultura com olhar antropológico, super aberto e considerar que tudo é cultura? Fica amplo demais pra qualquer curadoria. Também acho que pensar cultura só como arte (como faz o MinC), seria restritivo. Então vamos pensar juntos: construção de casas? Está lá na programação da Virada. Tudo bem que arquitetura é cultura, mas construir casas é ação social e não cultural. E se é financiada por empresas privadas e terceiro setor... Não saiu do orçamento da Virada. Está na programação por quê mesmo?

Estou tentando, mas está difícil entender o que é a Virada.

O acesso é garantido a todos? Vamos pensar em informação, ingresso e localização. A grande mídia divulga bastante, mas será que pessoas que não consomem cultura normalmente se sentem convidadas a participar desta “grande festa”? As pessoas sabem quais eventos são gratuitos e quais têm ingressos cobrados? Porque nem todos os eventos são gratuitos? Se é para promover um final de semana excepcional na cidade, por que não franquear a entrada em todos os eventos?

Concentrar os eventos no Centro não significa facilitar o acesso. Pessoas que moram longe do Centro podem ter que gastar muito tempo e dinheiro para chegar aos palcos. Para democratizar, os eventos deveriam se espalhar pela cidade toda, todas as regiões, no meu entender. Em uma das matérias que vi ou li sobre a Virada, alguém defendeu que a realização no Centro visava a sua divulgação e revitalização. Um único dia, onde as pessoas sabem que o local estará movimentado, com esquema especial de segurança... Será que as pessoas que freqüentam a Virada vão mesmo se sentir estimuladas a voltar ao Centro em um outro dia normal? Tenho sérias dúvidas se isto funciona. E falar em “formar público” e “permitir acesso” com os eventos da Sala SP tendo ingressos entre R$ 22 e R$ 50?

O Brasil tem mania de recorde. A iniciativa da Virada parece uma tentativa desesperada de bater um recorde de eventos, em pouco tempo, não importa a qualidade. Pra quê tanto evento em um único dia? Porque não diluir estes eventos ao longo de um ano? Acho que desta forma estaria se promovendo mais a cultura e se permitindo a participação de um público maior. Maratona em 24h: é possível acompanhar? Uma das justificativas de realização da Virada Cultural é a formação de público. No meu entender, sem um trabalho de educação e sem uma programação permanentemente acessível ao público, não estamos formando público nenhum! Então um dia de “eventos” não funciona.

Política Cultural

A Virada Cultural tem um peso importante no orçamento anual da Secretaria de Cultura. Mas sendo uma ação tão pontual, e sem uma visão direcionada (uma verdadeira curadoria), não pode ser confundida com política cultural.

A intenção da iniciativa pode até ser boa. Mas a conclusão que eu tiro é de que é preciso uma virada na Virada Cultural. Para melhor, claro.

O jornal Folha de SP questiona em sua matéria publicada na sexta-feira sobre um possível cunho eleitoreiro desta proposta, especialmente devido ao crescimento do valor gasto do ano passado para este: um salto de 3 milhões de reais. É uma insinuação pertinente, apesar da Virada existir há alguns anos.

Aliás, a grande explicação da Virada está no seu histórico. Houve uma grande descontextualização e deturpação no seu caminhar até aqui. Inspirado no evento das Noites Brancas de Paris (onde os eventos tinham continuidade e onde o governo investia em novos artistas e oferecia a eles novos palcos para se apresentarem, além das noites brancas... Então não eram só 24h...) a Virada aqui é outra coisa. No Rio de Janeiro, ela tem um contorno de fazer a população superar o medo da violência e sair às ruas brindando cultura. Ainda acho que também poderia ser melhor aproveitada, mas há uma justificativa “psicológica” para uma ação tão pontual.

Enfim, o que eu desejo é que a Virada não continue sendo replicada em outros lugares desta forma tão desconectada de tudo: de propósito, de sentido, de pensamento, planejamento, conteúdo. Que em SP e em outros municípios onde já se realiza, que ela ganhe profundidade e se transforme em uma ação de democratização efetiva, além de ter uma proposta educativa e de verdadeira aproximação entre artista e público, em todos os gêneros e estilos artísticos, em todas as manifestações culturais. Aí sim poderemos aplaudir de pé e gritar “bravo!”.

sábado, 15 de maio de 2010

Cebolas e afetos

Tenho cheiro de cebola nas mãos
Com graça enfeito
A comida daquele
com quem me deito

Tenho cheiro de cebola nas mãos
Temperos
Pequenas porções como forma
De afetos

Tenho cheiro de cebola nas mãos
Rotina
O desafio diário de agradar
Que não me anima

Tenho cheiro de cebola nas mãos
Suor
E força nos pés
Que me movem para longe da solidão

Tenho cheiro de cebola nas mãos
E um tédio
Tedioso desejo diário
De não tê-lo

Tenho cheiro de cebola nas mãos
E um gosto azedo na garganta
Um engasgo reprimido
Talvez devesse ter dado o grito

Tenho cheiro de cebola nas mãos
E uma vontade a me esperar
Tenha cuidado
Posso lhe devorar

sábado, 8 de maio de 2010

Maternidade




Homenagem à parte mais feliz de mim: a mamãe Dani.
Feliz dia das mães!!

Mergulhar em Ficções


Queria mergulhar em ficções...
Escrever, apenas.
E viver em outros mundos
No plural, sempre
Pois um único mundo
Seria o mesmo que viver neste
A mesma prisão
Queria a liberdade,
A isenção e a distância
De estar em outras vidas
E o poder de escrever seus destinos
Queria estar sempre em êxtase
Esta sensação embriagadora
Que as palavras me dão.
Queria ter constante
Este olhar potente e profundo
Investigativo e reflexivo

Queria ter mãos
Capazes de acompanhar
Todas as ideias que me escapam
Plenas de sentimentos
E experiências
Verídicas
Mas para usar, as mãos,
na ficção
Na criativa criação
As ideias e sentimentos?
Isso não sei, não
Talvez embutidos na ilusão
Escondidos nos pensamentos
Que não se transformam em palavras
Ou me entregam mais que imagino
Revelando o que sinto.

Queria mergulhar em ficções
Para me perder
E não me achar
Diluída em personagens
E histórias que não são minhas
Mas muito me dizem;
Muito de mim dizem.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Recados


Mando recados para quem não os lê
De que adiantam?
São sinais, são pistas. Provas.
Avisos?
Chances.

Espero vozes de bocas que se calam
Falo a quem não me ouve
E sigo passos acelerados
Rumo a lugar nenhum.
Tenho o nada em tudo.
Sou tudo nada ou pelo menos muito nada.

Escrevo pra ninguém
E espero o que não sei.
Nunca indiferente.
Anseio...
Apenas não posso definir.
Vivo sem paixão
E sem solidão
Mas com solitude.
Não sei desistir.
Insisto no que não acontece
E acostumo o ser a não ser
Sendo.


SP, 26/04/2010

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Filhos e padrões de consumo

Depois de ser mãe ocorre naturalmente de nos debruçarmos mais sobre as questões da maternidade. Além disso, é natural que mais pessoas venham lhe falar sobre o assunto. O fato é que o tema se torna mais freqüente entre conversas, sejam com outros pais ou até mesmo com aqueles que ainda não o são.

E tenho me espantado muito com tudo o que tenho ouvido e visto, especialmente de pais e mães. Quando falam sobre porque tiveram ou querem ter seus filhos, como querem criá-los ou como os estão criando, o que pensam e esperam desta nova empreitada em suas vidas, os pais têm deixado claro coisas que me surpreendem muito, negativamente.

Lamentavelmente, eu tenho constatado que filhos são objetos de consumo. O desejo de ter um filho não vem do amor, da vontade de criar uma criança, educá-la, amá-la incondicionalmente e ter esta outra vida como sua prioridade. Infelizmente, pais e mães têm filhos porque é o que a sociedade espera deles, porque querem estar no mesmo padrão dos amigos, porque podem deixá-los na creche ou com a babá quase 24 horas por dia e afirmo ousadamente que a única diferença entre o desejo de ter um filho ou comprar um carro novo é o risco que a primeira opção traz em si: de ter um filho com problemas de saúde, por exemplo. No mais, os filhos são desejados tal qual um objeto qualquer.

Ter um filho é uma meta a alcançar. Assim como algumas pessoas casam e se mantêm casadas por questões de aparência, tenho notado a mesma frieza em certos pais. Ter um filho pode fazer parte de uma competição entre grupos de amigos ou familiares. Depois o que fazer com ele é um problema para a creche e a escola resolverem. E não estou exagerando. Evidentemente não estou dizendo que toda a humanidade tem se comportado assim: para meu alívio, conheço muitos pais que tiveram seus filhos por amor (a eles). Mas é fato que muitos pais têm seus filhos por amor à sua própria imagem. E o que eu tenho sentido, é que isto é uma tendência que tem muito a ver com o nosso modelo de sociedade de consumo desenfreado. Ter filhos faz parte disso. Terceiriza-se a educação, o bem estar, os cuidados básicos... É possível ter babá 24h, inclusive nos finais de semana. A responsabilidade de educar fica absurdamente relegada exclusivamente para a escola. Os cuidados básicos (que também significam carinho e atenção) são realizados por terceirizados contratados para tais funções. Pais querem sair e viajar sozinhos (o que não é nenhum pecado, desde que as crianças já tenham idade suficiente para compreender esta separação. O problema é que os pais não querem esperar alguns anos...).

Quais os cuidados destes pais com seus filhos? Quais os momentos que passam verdadeiramente juntos se até para passear as babás vão junto – assegurando a “paz” destes pais? Qual o tempo dedicado a seus filhos, à brincadeira, ao riso? A prestar atenção exclusivamente neles, estar junto integralmente?

Sim, é preciso trabalhar, pagar as contas e garantir um bom futuro, uma boa educação para os filhos. Mas educação sem amor, sem afeto, sem atenção: funciona? Amor, afeto e atenção exigem tempo, dedicação. “Ter que trabalhar” virou a desculpa perfeita, mas se avaliarmos bem, olhando amiúde, não cola na grande maioria dos casos.

Alguém pode estar pensando: fácil ela falar pois ficou em casa com a filha... Minha opção não foi sem sacrifícios: antes, durante e depois. Não foi à toa que eu sempre quis ser mãe e adiei isto até o momento em que o pudesse ser da maneira que entendia correta. Pode parecer radical, mas não é: defendo que só se deve ter um filho quando se tem as condições para tal. E condição não é ter grana para colocar na melhor escola e viajar todo ano. Mas ter o suficiente para se manter uma casa saudável e TEMPO para se dedicar a esta criança. Estar junto com ela. Isto sempre foi essencial na minha cabeça. Eu sempre me impressionei com as minhas amigas que tinham bebês e voltavam antes da licença maternidade acabar, achava aquilo um crime. Ficava sentida pelas crianças, juro. Comovida. Ou com as amigas que trabalhavam até altas horas e viajavam muito, tendo filhos pequenos. É o dilema da mulher moderna? Em parte sim, equilibrar realização pessoal, profissional e maternidade. Mas o fato é que muitas mulheres PODEM abrir mão do lado profissional por um tempo. Com um pouco de organização financeira em casa e um sacrifício pessoal de passar uns tempos como dependente, é possível dedicar-se ao bebê além da licença maternidade e dar a ele o melhor que ele precisa: atenção, carinho e amor. (Eu defendo que se passe todo o primeiro ano de vida junto com a criança e depois, gradativamente, vá havendo o afastamento natural e também necessário para a criança). Mas por que não abrem mão? Porque não podem, não conseguem ficar sem consumir. O que importa mais: poder comprar a bolsa ou sapato que lhe der na telha – mais um na sua coleção – ou ter tempo para brincar de massinha com seu filho? Muita gente não se dá conta, porque a sociedade de consumo é perversa e te envolve sem que sinta, mas desculpas são inventadas a pretexto de se ter o PODER de consumir. Qualquer coisa. Será que não dá mesmo pra ficar uns meses sem trabalhar e deixar as contas por conta do marido ou vice-versa (por que não o pai ficar com a criança?).

Foi quando percebi, nestas conversas mais recentes, de mãe para mãe, que muitas não querem de fato ter um filho. Tê-los faz parte de um padrão de consumo a ser atingido. De um status social.

(parêntese fundamental: não estou dizendo que minhas amigas que viajavam e trabalhavam muito ou que voltaram antes do tempo da licença eram estas pessoas. Em muitos casos, realmente precisavam ou eram obrigadas por uma série de fatores – que dariam outras reflexões – a fazer isto)

Não tenho condições de desenvolver uma tese sobre o assunto: precisaria ter conhecimentos muito mais profundos de sociologia, antropologia e psicologia, mas é uma triste constatação a que eu cheguei: para muitos, hoje em dia, filhos são parte de um grande projeto de consumo e status social. E ou são trocados pela falsa sensação de poder que o consumo nos dá.

Não sou leitora do Padre Fábio de Mello, mas li em algum lugar uma frase dele que gostei demais e até “adotei” no meu Orkut: “não há amor fora da experiência do cuidado”. Concordo e acho que a frase se encaixa plenamente no caso da pa/maternidade. Quando será que a nossa sociedade irá perceber que seres humanos melhores serão criados a partir do momento em que valorizarmos mais este cuidar e o estar junto do que o tanto de “coisas” que insistimos em querer lhes proporcionar?

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Sótão tão só

Sótão tão só
A solidão de estar
Espaço vazio
Tão só
Com uivos do vento
A servir de música
Decoração de poeira
O sótão misterioso
Silencioso e vazio
Preenchido de espaço
E fantasias
Sótão tão só
Incomunicável
Inacabado
Desenhado para ser separado
Tão distante e logo aqui
Inacessível como quem o possui
Sótão tão só
Trancado
Fechado
Oculto
Meu ser tão só
Tão meu
Só meu
Meu sótão
Tão só


Escrito no Rio de Janeiro, em 21/04/2010

domingo, 25 de abril de 2010

A cidade amiga



A cidade maravilhosa é como a melhor amiga. Cheia de defeitos, mas os defendemos ou fingimos que não os enxergamos.

A cidade maravilhosa é sua, tal qual a melhor amiga: só você a vê daquele jeito. Ela só se mostra pra você, daquela forma específica. Trocam segredos, são confidentes.

Assim como a amiga, é possível ficar anos sem vê-la. Mas sabemos que está lá e que irá nos receber de braços abertos, a qualquer hora, a qualquer momento que queiramos vê-la. Quando precisar dela, basta ir ao seu encontro.

A cidade maravilhosa encanta, mas também briga com você. Igualzinho à amiga. Te expulsa, te repele, te empurra pra longe. E te chama de volta, linda, sedutora, encantadora. Irresistível.

Lindos passeios, muitas histórias vividas juntas. Risos, choros, praias, curvas, luares: podem compartilhar tudo. E uma permanece na história da outra.

O melhor de tudo é saber que ela sempre vai estar ali; amada.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Indo, voltando, fazendo, desfazendo e encontrando o mesmo ponto ou porto


As idas e vindas
De uma vida que não nos pertence
São muitas
As amizades se vão e vêm
As mesmas, outras
São partes de nossa história
Marcam épocas, mudam
nossas perspectivas, nossas vidas
Transformam nosso pensar
Nos formam e reformam
São encontros e reencontros
Gratas surpresas
E desencontros
Que partilham nosso destino
Alteram o caminho e
Acompanham

Gentilezas e delicadezas
Costuram novas promessas
de interromper a rotina
E exercitar o partilhar
Um pouco do que somos e sonhamos
Para colorir e alegrar,
Encantar.
Provocar também, porquê não?
E retomar os carinhos
Porque os amigos
Estão aqui dentro.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

A corrupção começa em casa e por pouco, muito pouco.



Pais responsáveis que somos, fomos dar a vacina contra a gripe h1n1 na Bruna semana passada, aqui no Instituto Pasteur, na Av. Paulista. Nos deparamos com uma pequena fila, umas três crianças na nossa frente e uma jovem, de uns 20 anos, aproximadamente. Nem estranhei o fato dela estar na fila, embora não fosse a sua faixa etária a da vez na convocação. Ela poderia estar grávida... Mas foi a própria quem se apressou a contar sua história: ela estava ali guardando lugar para sua mãe, com a perna quebrada, sentada num banco próximo. Até aí, continuei sem desconfiar de nada, afinal, a mãe dela, embora não estivesse na faixa etária convocada a se vacinar naquele período, poderia ter alguma doença crônica, o que a tornaria imediatamente uma candidata ao medicamento em qualquer época. Mas como diz o meu pai, “peixe morre pela boca”: a menina continuou a falar... E disse - talvez contente de poder se gabar de sua “esperteza” - que havia tomado a vacina no dia anterior, alegando ter uma doença crônica, que deixou claro não ter. Não bastasse ela ter sido desonesta, deu a idéia para sua mãe, que estava ali então, seguindo o “belo exemplo” da filha. Ou seja, não só a mãe não a repreendeu, como ainda seguiu o mau exemplo.

“Que país é este?” diria Renato Russo acertadamente. Quem são estas pessoas que querem tirar vantagem de TUDO? Mesmo tendo um calendário de vacinação e não tardando a chegar a vez daquela jovem (esta semana começa a vacinação para pessoas da idade dela), ela tinha que burlar e tomar primeiro. E olha que a vacina é injetável e tem gente à bessa reclamando de dor... Mas existe o ditado que diz que “de graça, até injeção na testa”. Pelo visto, é fato.

Mas a conversa piorou, acreditem. A jovem estava também acompanhada de seu pai. Este já tinha tomado a vacina, mas disse ser diabético “de verdade”. Só que ao invés de recriminar as duas mocréias desonestas que tem em casa, ele as incentivou a mentir para se adiantarem ao calendário e mais: resolveram os dois, pai e filha, começar uma campanha para que eu e meu marido “aproveitássemos” que já estávamos ali para também mentirmos, dizendo que tínhamos alguma doença crônica e assim poderíamos tomar “logo” a vacina. Detalhe: em maio nossa faixa etária estará contemplada. Mas impressionava vê-los nos dando argumentos, nos mostrando como era “fácil” burlar. Ainda me disse a garota: “ninguém pergunta nada, elas nem conferem nada. É só você dizer que tem alguma coisa”.

Obviamente, melhor do que qualquer resposta que tenhamos dado, o nosso comportamento os fez calar, pois obviamente só demos a vacina na Bruna e fomos embora sem inventar nenhuma doença. (embora estivessem imediatamente à nossa frente na fila, no local estavam sendo atendidos dois por vez, por isso fomos atendidos ao mesmo tempo, o que garante que eles viram como nos portamos)

É bem provável que ainda tenham nos julgado como otários, os espertos. Eu seguirei como otária pela vida afora, com o maior orgulho, no que depender de ter atitudes como as daquela família. E são pequenos gestos como estes que dizem muito, dizem tudo, sobre o caráter de uma pessoa. E sobre o comportamento de um país. São pessoas que se corrompem por tão pouco que depois votam por um saco de cimento e no final ainda reclamam dos políticos. São aquelas pessoas que reclamam das enchentes, mas que jogam seu lixo na rua. Para estas pessoas, a responsabilidade de ser honesto, de ser correto, de fazer a sua parte, é do outro e não dela. E digo isso porque as pessoas em geral acham que se o delito é “pequeno”, se é por uma coisa aparentemente “menor”, ele não tem importância. O que não se dão conta, é de que não existe menor ou maior, pequeno ou grande quando se trata de honestidade. Por isso aquele pai não repreendeu a filha e a mãe também não se preocupou em ser exemplo de coisa nenhuma! Esquecem, no entanto, que “o hábito do cachimbo faz a boca torta” (hoje estou afeita a ditados!). São pequenos e constantes delitos que formam o mau caráter que é capaz de fazer um prédio com areia da praia mesmo sabendo que ele corre o risco de cair matando centenas de pessoas...

Agora pensa comigo: golpe para tomar vacina?!!! Me parece demais, não?!!! Caramba! Eu estou em outro planeta ou o que eu acabei de relatar também impressiona você? Pois falando séria e honestamente: a mim, horroriza que as pessoas tenham chegado a este ponto!

quinta-feira, 1 de abril de 2010

O Querer

Eu quero mais!
Mais, muito mais!
Quero tudo de tudo;
Quero mais de tudo
E mais do mesmo.
Eu quero
Até o que eu não sei.
O que eu não vi
E não provei.
Mas eu quero!
Estou sedenta
e gulosa.
Quero ar e água,
sol e lua,
fogo e mar.
Quero terra também
Onde possa pisar
Para caminhar
até onde tudo alcançar.

domingo, 28 de março de 2010

Eu tenho preço

Quer me comer?
Tem que pagar.
Não em espécie, moeda.
Mas precisa me fazer sonhar.
Precisa me valorizar
Me despertar
Me desejar
Me amar.
Quer me comer?
Tem que pagar.
O preço é baixo
É só me acompanhar
Me fazer fantasiar
Me encontrar
Me fazer gargalhar
Me elogiar.
Até pode presentear...
Sim, eu "aceito uma prenda,
qualquer coisa assim,
como uma pedra falsa,
um sonho de valsa
ou um corte de cetim"
Mas tem que pagar
Pra me amar.
Então, vai almoçar?

sexta-feira, 19 de março de 2010

Devolve a minha mãe!


Assistam no link ao final deste desabafo a cena que gerou um incômodo no meu peito por três longos dias... Se eu já me comovia com cenas que envolvem crianças antes de ser mãe, imaginem agora. Eu me revolto!!

A hipocrisia da nossa sociedade é muito grande e a justiça é muito pequena. Aquilo não é justiça! A criança estava evidentemente bem cuidada. Criança saudável, limpa, arrumadinha e DESESPERADA por estar sendo separada da mãe. Quer sinal mais evidente de que esta mãe não é uma monstra?

Pra mim, o único motivo no mundo justifica separação de mãe e filha é maus tratos. Se houvesse relato de que essa mãe batia ou maltratava esta criança, aí sim eu vejo motivo para se expedir um mandato, que, ainda assim, não deveria ser cumprido daquela FORMA. Nem mesmo neste caso uma criança poderia ser separada da mãe de maneira tão violenta! Pelo bem da saúde mental, psíquica deste bebê (vale lembrar que a menina tem 1 ano e 2 meses).

Se esta mãe usa a criança como apelo para pedir esmola, o que dizer das mães que exploram seus filhos, muitas vezes expondo a pressões psicológicas absurdas, em concursos de beleza, de miss, ou em competições para a criança trabalhar na TV? Estas também serão separadas das mães? Tudo neste país é uma questão de poder aquisitivo, por isso eu digo que somos hipócritas. Estas mães que atropelam a infância de seus filhos e filhas para ganhar dinheiro e status e realizar suas frustrações através delas, não têm a sua maternidade questionada e não são chamadas de exploradoras porque estão em outro “nível” da sociedade.

A outra, como é cigana, teve a filha arrancada de seus braços. Repito: se esta criança não sofre maus-tratos, está bem cuidada, limpa, sem fome e não tem a sua vida e saúde (física e mental, psicológica) colocada em risco, ela não pode ser separada da mãe. Maior trauma e danos psicológicos causaram a esta criança nesta ação medíocre da “justiça” brasileira.

A ação é tão mal planejada e absurda que ainda levam a criança no carro no banco da frente! É a própria justiça (ali representada pela polícia) burlando as leis e, neste momento, expondo a criança a riscos de vida!!!

Não acho que devemos julgar esta mulher como mãe, nem boa nem ruim, simplesmente porque não temos capacidade para isto e tampouco elementos concretos. O fato dela ser andarilha, cigana, pedinte, não a caracteriza como uma mãe melhor ou pior que nenhuma outra. Pra mim, a solução é simples e o choro de desespero daquela criança ao ser separada de sua mãe já diz muito: se a criança está bem tratada (isso inclui CARINHO E AMOR acima do fato de se ter um teto ou não; um “lugar seguro” para ela dormir – afinal, onde estamos SEGUROS neste país?! Nas nossas jaulas cheias de grades que chamamos de apartamentos?); enfim, se a criança tem o carinho de sua mãe e é bem cuidada, não há porque retirar a guarda desta mãe.

Pelo bem DA CRIANÇA que é uma inocente, não pode dizer qual seria a sua escolha e parece não estar sendo considerada nesta ação. O uso da força, neste caso, só reforça que o poder está ao lado só de quem tem grana neste país. Pudessem estes pais pagar um advogado e esta criança não passaria nenhum dia num abrigo...
Acho que se aquela criança pudesse falar, ela gritaria bem alto: “moço, devolve a minha mãe!”. Cheia de razão, coisa que falta aos adultos desta nossa hipócrita sociedade.

OBS: soube hoje pelo mesmo jornal (que confesso estar assistindo diariamente só para acompanhar o caso) que a criança foi devolvida à mãe. Passaram 4 dias separadas. Com um agravante, que a imagem mostrada no jornal hoje revelou: este bebê é lactante, ou seja, ainda amamenta em sua mãe! Isto torna esta separação ainda mais sofrida. Eu diria criminosa. E querem saber por que eu repeti tantas vezes a palavra hipócrita no meu texto? Adivinhem só quem foi o juiz que devolveu a filha à mãe? O mesmo que as separou! Certamente, assustado ou mobilizado pela repercussão pública que o caso tomou. CRETINO!!!

Eis o link para a matéria com a cena chocante:
http://g1.globo.com/jornalhoje/0,,MUL1533383-16022,00-CRIANCA+E+ARRANCADA+DA+MAE+EM+JUNDIAI.html

OBS 2: Ah, eu rezei. Rezei mesmo pra que esta criança fosse devolvida à sua mãe...

quinta-feira, 18 de março de 2010

Dia da mulher



Revira, boceja, abre um olho. Escuridão, silêncio. Visão embaçada. Estica, espreguiça, abre os olhos. Levanta, anda, abre janelas. Luz, claridade. Olha a filha no berço. Toma seu café, dá uma olhada no jornal. Vai ao banheiro, liga o computador, escolhe a roupa. Olha a filha. Tempera carne. Baixa os emails. Põe roupa pra lavar. Olha a filha, acorda o marido, toma banho. Se arruma rápido. Acorda a filha. Amamenta. Troca um sorriso com a filha e ganha paz no coração. Se despede do marido. Arruma a filha, brincando. Leva a filha na escola. Volta, cuida do almoço. Lava louça. Pensa que deveria ter feito as unhas. Lê e-mails entre uma cebola e um alho. Trabalha. Fala ao telefone. Paga contas, faz compras, carrega peso. De salto alto. Tem reunião. Atrasou, precisa correr para buscar a filha. Brinca, dá banho, dá carinho. Dá comida. Janta. Põe a janta do marido. As horas passaram rápido. Está escuro, ainda não leu direito o jornal e nem metade do que pretendia. Sente dor, menstrua. Come doce. Não é comida. Toma banho rápido, põe a filha para dormir. Volta ao computador. Vê um filme ou bobagem qualquer na tevê, para relaxar. Estica as pernas. Passa um creme. Embaça a vista. Cansa. Deita. Não dorme. Dorme. Não dorme. Revira, boceja, abre um olho. Mais um dia da mulher.

SP, 08/03/2010.

Inspirada pelo dia da mulher e com a frase da música de Chico Buarque na cabeça (“todo dia ela faz tudo sempre igual”).

domingo, 7 de março de 2010

Museus modernos?



Se alguém que me lê não sabe, eu sou museóloga. Sim, esta é a minha formação. Bizarra, pensam alguns, ainda. Fazer o quê?

Museus sempre fizeram parte da minha vida. Comemorei muitos aniversários, ainda criança, no Parque da Cidade do Rio de Janeiro, com obrigatórias - por MINHA insistência - visitas ao Museu da Cidade. E sempre frequentei estes espaços de memória, fosse em passeios e viagens com meus pais na infância ou depois.

E sempre me diverti e curti muito estes passeios.

Hoje, com as novas tecnologias e a arte propondo a interação do espectador, com as novas formas de comunicação que aceleraram o tempo da gente, os museus se sentem na obrigação de mudar e acompanhar a vida contemporânea. Concordo que seja necessário: museus não devem parar no tempo; "a vida não pára". E museus vivos devem caminhar junto, se modernizar sim. Eu mesma sou fã de exposições interativas em que arte ou história e tecnologia se integram e nos integram no conteúdo da mostra.

Mas é preciso um certo cuidado. Pirotecnias podem transformar exposições em cenário. E isso pode confundir o público. Afinal, ele saiu de um espetáculo de ficção ou ele saiu de um museu com informações reais de alguma vida, tempo ou espaço? Existe uma tendência ao exagero e, como em tudo na vida, é preciso equilíbrio. As intervenções de cenógrafos, curadores, arquitetos, iluminadores precisam ser focadas no conteúdo da mostra e servir a este fim e não ser uma atração à parte, um elemento a se destacar e desviar o foco do tema exposto.

Provocar a interação do espectador é fundamental para que ele, ao participar, absorva o tema com mais facilidade, de forma mais natural e tenha mais prazer em estar ali. Mas interação por interação é coisa para parque de diversões. O exagero transforma exposição em cenário, como eu disse acima. Conteúdo vira historinha e a impressão que fica é a de que você foi ao teatro, ao cinema 3D, ao parque e o que viu, leu, mexeu é apenas um conto, uma ficção.

Devagar com o andor.

OBS: foto tirada por mim (com meu iphone) de obra de Céleste Boursier-Mougenot apresentada no final de 2009 na Pinacoteca de SP em excelente mostra de arte.

terça-feira, 2 de março de 2010

Link

Ainda sobre o tema da mobilização, eis o link para artigo que comenta a nova instituição, a ALTERCOM, no ótimo e sempre lido Observatório da Imprensa:

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=579JDB001

Bééééé! (ovelhas não mandam beijos, não é mesmo?)

Engajamento

PARA ENTENDER ESTE POST É NECESSÁRIO LER O ANTERIOR, SOBRE "MOBILIZAÇÕES POLÍTICAS"

Duas constatações entristecedoras me vieram à mente após ter participado das reuniões que presenciei.

O debate, a iniciativa, a pulsação, a energia, a vontade política de mudar o mundo está nas cabeças (e nas mãos) de pessoas acima dos 40 anos. São poucos, raros, os jovens que participam.

Os jovens não estão envolvidos e não há interesses deles em se envolverem? Estas instituições estão interessadas nos jovens, que são o nosso futuro próximo? Jovens só se mobilizam e envolvem com o que diz respeito a consumo? (BBBs, inclusos) Ou só se organizam em torcidas - violentas, diga-se de passagem - organizadas? "A juventude é uma banda numa propaganda de refrigerantes", como dizia uma banda de sucesso na minha época de adolescência?

Ok, é claro que no caso específico das duas instituições que se reuniram na semana passada, a média de idade era alta até porque a experiência profissional daquelas turmas levou-os a questionamentos e necessidades que os fizeram se mobilizar daquela forma. Então é natural que sejam pessoas experientes, com uma trajetória profissional mais longa, o que as torna um pouco mais velhas.

Mas ainda assim, é válido o meu questionamento: em torno de quê os jovens estão se engajando? Ou eu estou muito por fora do que a juventude vem aprontando, ou eles não estão pulsando com aquele desejo de mudar o mundo que costumava ser associado à pouca idade.

A outra triste constatação que fiz é que este tipo de engajamento político, ao menos na área cultural, inexiste no Rio de Janeiro. Não faço idéia de porquê, mas não é possível sentir uma mobilização organizada no setor. Estão todos apáticos, silenciosos, à espera - sentadinhos, bem acomodados - do resultado final das mudanças que estão sendo promovidas pelo MinC. Não existe uma conversa coletiva sobre o assunto.

Cadê os jovens? O que fazem?
Cadê os cariocas? Em quê estão ocupados?

Curioso e preocupante.